A mão da minha mãe tem a pele molinha. Ela cheira alho na hora do almoço e creme na hora de ir à missa. Há machinhas pretas no dorso da mão dessa mulher. Acho que são das gotas endiabradas de óleo que pulam da panela em direção a mão dela. A mão da mamãe não é preguiçosa. Acorda cedo, passa roupa, descongela geladeira, poli a frigideira, trança o meu cabelo. Ao mesmo tempo em que sabe fazer coisas que precisam de força, também sabe fazer carinho.
A mão do vô era gorda, cumprida. Nunca vi mão mais grande! Eu lembro dele pousar a mão na testa, não sei se fugindo do sol, não sei se clamando de dor de cabeça. Já no final de sua vida ele enxergava pouco. A sua mão o guiava pelas paredes da própria casa. Uma vez, estava eu a pentear o cabelo sentada no sofá da casa dele. O vô se encontrava do meu lado e passou a mão numa mecha dizendo assim: Nossa menina! Você tem cabelo de mais! As lembranças terminam na primeira mão roxa que vi sobre um caixão.
A mão do peão era larga, grossa, mão de homem mesmo! De vez em quando a mão sungava uma fivela grande e dourada. Noutras vezes, ajeitava o chapéu para que, esse, ficasse alinhado ao olhar que ele usaria para me seduzir. Eram duas mãos bem usadas: Numa ele tinha uma corda imaginária para laçar moças desavisadas. Com a outra ele já agarrava a morena por traz e a levantava para que, sem pés no chão, ela reconhecesse que não tinha saída.
A mão do meu amor platônico é na verdade a mão que eu queria comigo para o resto da vida. Mão morena, grande também. Dizem que o tamanho do coração de uma pessoa é equivalente ao tamanho de sua mão fechada. O tamanho do coração dele é grande literalmente e poeticamente. A única vez que me aventurei com essas mãos foi estralando-as. Desajeito esse que deve ter contribuído com o fato dele jamais sonhar que um dia eu cheguei a gostar demais dos seus dedos, cutículas e pelinhos.
A mão da Aline (o bebê em que fiz um teste do pezinho) era uma miniatura mais que perfeita! Unhas: dois milímetros por dois milímetros. Pregas dos dedos resumidas. Certeza que a velhice aumenta a quantidade de pregas de uma mão. A mão da Aline era rosa. Não rosa choque ou rosa claro, mas rosa pele. E as pontas dos dedos da menina eram transparentes, consegui ver um capilar sanguíneo por ali.
As mãos são feitas de sangue e muitas vezes é o sangue que me permite conhecer uma variedade grande delas. Na minha rotina no postinho de saúde, a cada quarta feira eu furo aproximadamente dez mãos diferentes para avaliação de glicemia capilar (açúcar no sangue). Tem mão medrosa que arruma uma tremedeira grande, só de me ver arrancar a agulhinha da maleta. Tem mão que é tão grossa que precisa de agulha especial ou dois furos. Tem mão pequena, grande, fina e forte. Mão suja, limpa, seca e molhada. Mão machucada, mão bem cuidada. Mão que faz o bem, mão que faz o mal. Mão sem dedo ou com dedos a mais. Branca, preta, amarela de susto, vermelha de limpar batom. São muitas mãos!